Saturday, March 15, 2014

Recalculando a rota

... E eu cheguei em Frankfurt em um domingo, lá pela uma da manha, de mochila nas costas, totalmente cansada e ainda precisaria esperar quase uma hora para o próximo trem. Qualquer pessoa teria procurando um cantinho para ficar quieta nessa situação, mas não eu. Nesse intervalo de tempo, eu consegui dar conselhos para outros viajantes, bater boca com um mendigo, precisar fugir correndo e me esconder no McDonalds. - Eu contava as minhas aventuras a um amigo enquanto  saboreava um daqueles hambúrgueres enormes, tipo caseiro, nada parecido com o McDonalds, em uma lanchonete no bairro onde eu morava.
Ele sorriu.
- Não é exatamente o que acontece na sua vida que a faz tao interessante. Mas sim aquilo que você faz com aquilo que acontece. - disse ele.
Na verdade, esse amigo era uma daquelas pessoas com quem agente é feliz por algum tempo. Mas que depois desse tempo, simplesmente não é mais. Nem tudo o que é bom seria necessariamente bom para sempre. Felicidade é saber distinguir esses tempos.
O verão continuava lindo e dourado.
As minhas tardes eram bem acompanhadas, com diversos amigos no centro da cidade.
Entre lojas e cafés, sentados naquelas mesinhas redondas postas a rua, discutíamos sobre moda, teologia, economia, família, futuro...
Paralelo a isso, após algum tempo corrigindo pequenos erros de caligrafia e alguns conflitos com uma gráfica polonesa, conseguir finalmente imprimir a minha tese.
Com o certificado em mãos, eu estava pronta - pronta para ir embora de volta para o Brasil.
Metade das minhas roupas eu já havia enviado a doação. Casacos e outros acessórios de inverno não seriam mais necessários.
Mas foi em algum desses cafés no centro da cidade, em meio a uma dessas muitas conversas, alguém me disse que se eu quisesse mesmo voltar ao Brasil, já estaria por lá.
Talvez tivesse mesmo razão.
E foi assim motivada por uma dessas frases que faz um ninho na nossa cabeça que eu resolvi dar uma última chance para a Europa e me candidatei para algumas vagas de emprego nas redondezas.
Para minha surpresa novamente, meu celular tocou.
Sorvetinho em Frankfurt

Monday, March 10, 2014

C'est la vie...

... E no celular era mon petit peu, minha amiga Vero do Quebec. Ela estava vindo fazer um curso na Europa e passaria uns tempos na capital francesa.
Coloquei a minha mochila nas costas e parti de Genebra no próximo trem em direção a Paris. Lá, encontrei Vero acompanhada de outras canadenses que juntamente vieram para aproveitar as noites curtas do verão europeu na cidade de luz.
Vero foi umas das colegas de república que me ajudou quando eu morava no Canadá, após perder todos os móveis e roupas por conta de uma infestação de bedbugs.
São raras as pessoas para as quais o tempo parece simplesmente não passar; e como é interessante reencontrá-las após um longo intervalo. Elas nos fazem perceber o quanto nós mesmos mudamos. Talvez por uma mera lembrança de fatos ocorridos, ou então por um olhar longo e demorado, de olhos grandes e arregalados que exclamam sem receios: como você está diferente!
As meninas do Canadá eram todas marinheiras de primeira viagem na Europa. Trens, queijos e piqueniques eram novidades excitantes. O mais interessante para mim era notar que tudo aquilo já havia se tornado parte de uma vida quotidiana: o metro pichado, os batedores de carteira (que roubaram o Iphone da Courtney - eu avisei), os parques verdes com lagos e patinhos, os muitos turistas japoneses...
Sim, o tempo passa. O tempo passa por nós. Seja como brisa, ou como vendaval, ele imprime suas marcas mais profundas. Aqueles quatro anos de vida peregrina haviam me transformado em alguém diferente, mas apenas eu ainda não havia percebido...
O tempo também passou em Paris, de maneira muito agradável, com champagne e vista para a torre Eiffel.
Uma das nossas companheiras de quarto, era uma garota muçulmana bastante tradicional chamada Noeuf. Ela vestia roupas típicas e se ajoelhava em um tapete todos os dias para fazer as suas preces.
- Você se incomoda se eu ler a bíblia? - Perguntei.
- Não, eu fico feliz que você também tenha uma religião, assim você pode entender porque eu tenho a minha. - ela respondeu.
Todas as manhãs eram assim: eu lendo minha bíblia sentada na cama e ela ajoelhada fazendo suas preces no tapete. As outras meninas olhavam assustadas. Eu até posso compreender, pois essa era uma cena digna de uma fotografia.
Apesar de nossas diferenças, Noeuf se tornou mais uma amiga para a minha coleção. Foi muito interessante te-la também como companhia e poder ver Paris sob mais um angulo diferente.
Mas mesmo em terras francesas, o tempo continuou passando rapidamente e finalmente trouxe a minha hora de retornar a Alemanha.
A viagem prosseguiu após um abraco demorado da minha pequena velha amiga Vero, saudações das minhas outras novas amigas canadenses e promessas de que eu as iria visitar em breve no Canadá.
- Obrigada por tudo, obrigada por entender. - disse Noeuf.
Eu então entrei no próximo trem em direção a Frankfurt - que não partiu nas duas horas seguintes.
Os passageiros todos foram relocados para outros trens e uma viagem cheia de escalas, devido a contratempos nos trilhos.
Em uma dessas escalas, um palestino jogou uma mochila aos meus pés:
- Cuide para mim, já volto! - disse ele, antes de descer do trem.
Naquele momento, senti todos os meus ossos gelarem. Será que era uma bomba? Comecei a enviar mensagens a minha família, dizer que os amo e que estava tudo bem.
Pouco antes que eu tivesse um ataque cardíaco o tal palestino entrou novamente no trem e se sentou no degrau do vagão.
- Aqui está o que te pertence. - eu me levantei e levei a mochila até ele.
- Muito obrigada. - disse ele, que pegou a mochila e se sentou no meu lugar!
É cada criatura que agente encontra quando viaja...

descansando no campo de marte

aproveitando os últimos dias de estudante

McCafe em Paris é a coisa mais barata de café da manha

vivendo por aí...

A avenida mais charmosa
a mochila do palestino